1. Nuno
Álvares Pereira proclamado santo
3.
Virtudes e valores afirmados na vida de Nuno
Álvares Pereira
A 21 de
Fevereiro de 2009, o Papa Bento XVI anunciou a canonização de D. Nuno Álvares
Pereira o já beato Nuno de Santa Maria para o dia 26 de Abril, junto com outras
quatro figuras ilustres da Igreja.
Este
facto é para Portugal e os portugueses motivo de júbilo e de esperança. Deve
também constituir ocasião de reflexão sobre as qualidades e virtudes heróicas
desta relevante personagem histórica, digna de ser conhecida e imitada nos dias
de hoje. Nuno Álvares Pereira viveu em tempos difíceis de crise dinástica, com
fortes divisões no tecido social e político português, que punham em perigo a
própria identidade e independência da Nação.
Os
Bispos de Portugal, em nome de todos os católicos do nosso país, desejam
exprimir a sua alegria e gratidão pelo reconhecimento oficial da santidade
heróica de mais um filho da nossa terra. Ultrapassando a mera saudade do
passado e assumindo, com realismo e esperança, o tempo que nos é dado viver,
querem ressaltar algumas virtudes heróicas de Nuno Álvares Pereira, cuja
imitação ajudará a responder aos desafios do tempo presente.
2.
Breves dados biográficos
Nascido
em 1360, Nuno Álvares Pereira foi educado nos ideais nobres da Cavalaria
medieval, no ambiente das ordens militares e depois na corte real. Tal ambiente
mareou a sua juventude. As suas qualidades e virtudes impressionaram
particularmente o Mestre de Aviz, futuro rei D. João 1, que encontrou em D.
Nuno o exímio chefe militar, estratégia das batalhas dos Atoleiros, de
Aljubarrota e Valverde, vencidas mais por mérito das suas virtudes pessoais e
da sua táctica militar do que pelo poder bélico dos meios humanos e dos
recursos materiais.
Casou
com Dª. Leonor Alvim de quem teve três filhos, sobrevivendo apenas a sua filha
Beatriz, que viria a casar com D. Afonso, dando origem à Casa de Bragança.
Tendo ficado viúvo muito cedo e estando consolidada a paz, decidiu aprofundar
os ideais da Cavalaria e dedicar se mais intensamente aos valores do Evangelho,
sobretudo à prática da oração e ao auxílio dos pobres. Assim, pediu para ser
admitido como membro da Ordem do Carmo, que conhecera em Moura e apreciara pela
sua vida de intensa oração, tomando o profeta Elias e Nossa Senhora como
modelos no seguimento de Cristo.
De
Moura, no Alentejo, vieram alguns membros da comunidade carmelita, para o novo
convento que ele mesmo mandara construir em Lisboa. Em 1422, entra nesta
comunidade e, a 15 de Agosto de 1423, professa como simples irmão, encarregado
de atender a portaria e ajudar os (D. Nuno Álvares Pereira entrega o Convento do Carmo, por ele mandado construir,
aos Carmelitas) pobres. Passou então a ser Frei Nuno
de Santa Maria. Depois de uma intensa vida de oração e de bem fazer, numa
conduta de grande humildade, simplicidade e amor à Virgem Maria e aos pobres,
faleceu no convento do Carmo, onde foi sepultado.
Logo
após a sua morte começou a ser venerado como santo pela piedade popular. As
suas virtudes heróicas foram oficialmente reconhecidas pelo Papa Bento XV, que
o proclamou beato, em 19 1 8, passando a ter celebração litúrgica a 6 de
Novembro.
D. Nuno
Álvares Pereira não é apenas o herói nacional, homem corajoso, austero,
coerente, amigo da Pátria e dos pobres, que os cronistas e historiadores nos
apresentam. Ele é também um homem santo. A sua coragem heróica em defender a
identidade nacional, o seu desprendimento dos bens -e amor aos mais
necessitados brotavam, como água da fonte, do amor a Cristo e à Igreja.
A sua
beatificação, nos começos do século XX, apresentou o ao povo de Deus como
modelo de santidade e intercessor junto de Deus, a quem se pode recorrer nas
tribulações e alegrias da vida.
Conscientes
de que todos os santos são filhos do seu tempo e devem ser vistos e
interpretados com os critérios próprios da sua época, desejamos propor alguns
valores evangélicos que pautaram a sua vida e nos parecem de maior relevância e
atualidade.
Os
ideais da Cavalaria, nos quais se formou D. Nuno, podem agrupar se em três
arcos de ação: no plano militar, sobressaem a coragem, a lealdade e a
generosidade; no campo religioso, evidenciam se a fidelidade à Igreja, a
obediência e a castidade; a nível social, propõem se a cortesia, a humildade e
a beneficência. Foram estes valores que impregnaram a personalidade de Nuno
Álvares Pereira, em todas as vicissitudes da sua vida, como documentam os seus feitos
militares, familiares, sociais e conventuais.
Fazia
também parte dos ideais da Cavalaria a proteção das viúvas e dos órfãos, assim
como o auxilio aos pobres. Em D. Nuno, estes ideais tornaram se virtudes
intensamente vividas, tanto no tempo das lides guerreiras como principalmente
quando se desprendeu de tudo e professou na Ordem do Carmo. Como porteiro e
esmoler da comunidade, acolhia os pobres de -Lisboa, que batiam ás portas do
convento e atendia os com grande humildade e generosidade. Diz-se que teve aqui
origem a "sopa dos pobres".
Levado
pela sua invulgar humildade, iluminada pela fé, desprendeu se de todos os seus
bens que eram muitos, pois o Rei o tinha recompensado com numerosas comendas e
repartiu-os por instituições religiosas e sociais em beneficio dos
necessitados. Desejoso de seguir radicalmente a Jesus Cristo, optou por uma
vida simples e pobre no Convento do Carmo e disponibilizou-se totalmente para
acolher e servir os mais desfavorecidos. Esta foi a última batalha da sua vida.
Para ela se preparou com as armas espirituais de que falam a carta aos Efésios
(cf. Ef 6, 10 20) e a Regra do Carmo: a couraça da justiça, a espada do
Espírito (isto é, a Palavra de Deus), o escudo da fé, a oração, o espírito de
serviço para anunciar o Evangelho da paz, a perseverança na prática do bem.
Precisamos
de figuras como Nuno Álvares Pereira: íntegras, coerentes, santas, ou seja,
amigas de Deus e das suas criaturas, sobretudo das mais débeis. São pessoas
como estas que despertam a confiança e o dinamismo da sociedade, que fazem
superar e vencer as crises.
4.
Apelo à Igreja em Portugal e a todos os homens e mulheres de boa vontade
Ao
aproximar-se a data da canonização do beato Nuno Álvares Pereira, pelo Papa
Bento XVI, -em Roma, alegramo-nos por ver mais um filho da nossa terra elevado
às honras dos altares. Algumas peregrinações estão a ser organizadas para
marcar a nossa presença na Praça de S. Pedro, na festa da sua canonização, no
dia 26 de Abril. Confiamos que outras iniciativas pastorais sejam promovidas
para dar a conhecer e propor como modelo o exemplo de virtude heróica que nos
deixou este nosso irmão na fé.
A
pessoa e ação de Nuno Álvares Pereira são bem conhecidas do povo português.
A nível
civil, é lembrado em monumentos, praças e instituições; a nível religioso, é
celebrado em igrejas, imagens e associações. Figura incontornável da nossa
história, importa revitalizar a sua memória e dar a conhecer o seu testemunho
de vida. Para além de ser um modelo de santidade, no seguimento radical de Cristo,
que "não veio para ser servido mas para servir" (Mt 20, 28), apraz
nos pôr em relevo alguns aspectos de particular atualidade, para todos os
homens e mulheres de boa vontade:
Nuno
Álvares Pereira foi um homem de Estado, que soube colocar os superiores
interesses da Nação acima das suas conveniências, pretensões ou carreira. Fez
da sua vida uma missão, correndo todos os riscos para bem servir a Pátria e o
povo.
Em
tempo de grave crise nacional, optou corajosamente por ser, parte da solução e,
numa entrega sem limites, enfrentou com esperança os enormes desafios sociais e
políticos da Nação.
Coroado
de glória com as vitórias alcançadas, senhor de imensas terras, despojou se os
seus bens e optou pela radicalidade do seguimento de Cristo, como simples irmão
da Ordem dos Carmelitas.
Não se
valeu dos seus títulos de nobreza, prestígio e riqueza, para viver num clima de
luxos e grandezas, mas optou por servir preferencialmente os pobres é
necessitados do seu tempo.
Vivemos
em tempo de crise global, que tem origem num vazio de valores morais. O
esbanjamento, a corrupção, a busca imparável do bem estar material, o
relativismo que facilita o uso de todos os meios para alcançar os próprios
benefícios, geraram um quadro de desemprego, de angústia e de pobreza que
ameaçam as bases sobre as quais se organiza a sociedade. Neste contexto, o
testemunho de vida de D. Nuno constituirá uma força de mudança em favor da
justiça e da fraternidade, da promoção de estilos de vida mais sóbrios e
solidários e de iniciativas de partilha de bens. Será também um apelo a uma
cidadania exemplarmente vivida e um forte convite à dignificação da vida
política como expressão do melhor humanismo ao serviço do bem comum.
Os
Bispos de Portugal propõem, portanto, aos homens e mulheres de hoje o exemplo
da vida de Nuno Álvares Pereira, pautada pelos valores evangélicos, orientada
pelo maior bem de todos, disponível para lutar pelos superiores interesses da
Pátria, solícita por servir os mais desprotegidos e pobres. Assim seremos parte
ativa na construção de uma sociedade mais justa e fraterna que todos desejamos.
Fátima, 6 de Março de 2009
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