Pe. Frei Francisco
J. Rodrigues, O. Carm. (Vice Postulador)
Nuno
Álvares Pereira, uma das mais altas figuras da História Portuguesa foi
guerreiro, herói e santo. Nasceu a 24 de Junho de 1360. Depois de uma vida
longa e depois de ter contribuído com a sua coragem, inovação de procedimento e
o seu brio militar para a consolidação da Independência de Portugal no momento
mais crítico da sucessão, deixou a vida militar e entregou se à vida religiosa,
já quando tinha 63 anos. Professou a 15 de Agosto de 1423. Morreu na'sua cela
no convento que ele mesmo construíra em 1 de Abril de 1431 com 71 anos no dia
de todos os Santos de 1431 (ao tempo 511 Domingo da Páscoa). Aplica-se bem o
ditado "tal vida tal morte". Uma vida vivida totalmente para Deus e
sua Mãe Maria Santíssima e para os homens seus irmãos. Assim descreve o
Cronista Carmelita Frei José Pereira Santana "Continuando o Venerável Nuno
de Santa Maria as asperezas da vida, sem nunca afrouxar dos seus primeiros fervores,
chegou ao ano de 1431 tão destituído de forças, que no corpo apenas conservava
alguns alentos para poder mover-se.
Entrando
enfim na última agonia, rogou que, para consolação do seu espírito, lhe lessem
a Paixão de Cristo escrita pelo Evangelista S. João; logo que chegou à cláusula
do Evangelho onde o mesmo Cristo, falando com Sua Mãe Santíssima a respeito do
amado discípulo, lhe diz: Eis aqui o vosso filho, deu ele o último suspiro e
entregou sua ditosa alma ao mesmo Senhor que o criara".
A
triste nova correu célere a cidade, que se cobriu de luto. "Morreu o
Santo! Morreu o Santinho"! ... foi o grito que se levantou em toda a
cidade aos ouvirem os sinos do Carmo.
Os
olhos dos humildes, dos enfermos, arrasavam-se de lágrimas! O povo, que o
canonizara em vida, jamais abandona a romagem piedosa no Convento do Carmo.
A fama
da santidade estendeu se por todo
o povo.
Não
tardou que lhe consagrassem altares em que se celebrava Missa em sua honra com
tácito consentimento da autoridade
eclesiástica e depois com aprovação clara, não só em Lisboa, mas também nas
comarcas de Avis e Cernache do
Bonjardim.
Logo se
começaram a lavrar algumas imagens do Condestável que foram expostas nalgumas
Igrejas de Lisboa e de outras terras do país. Chamava lhe o povo Santo
Condestável, e acudia a visitar o túmulo e a levar lhe ofertas em animadas
romarias.
Na
Oitava da Páscoa, era a Peregrinação das mulheres de Lisboa, que se juntavam na
Capela-Mor do Mosteiro do Carmo, cantando versos ao som de pandeiros e adufes.
Na Oitava
de Pentecostes, era a dos habitantes do Restelo e Belém, que vinham em cortejo,
de batéis pelo rio desembarcar em Santos e daí subiam ao Carmo a fazer junto do
túmulo as suas orações e descanses.
A 24 de
Junho vinham os habitantes de Sacavém com uma oferenda de azeite e a 15 de
Agosto, os de Almada com muitas candeias e velas.
O povo
celebrava nas suas trovas os inúmeros milagres que a tradição ia atribuindo ao
Santo Condestável, desde as ressurreições dos mortos, até às aparições e cura
de toda a espécie de enfermidades.
Sem
chegar a extinguir se, este culto popular resfriou com o tempo. Diz se que
durante o domínio Castelhano, se deu o nome de Santo Amaro à imagem do
Condestável que se venerava em Moura. Cessaram as romarias ao Carmo porque o
templo ficou arruinado com o terremoto de 1755.
As
invasões Francesas, as lutas civis, a extinção das ordens religiosas eis outros
tantos motivos que explicam o declínio desse culto.
Manteve
se, porém, o que parece, sem interrupção, na Capela da Ordem Terceira do Carmo,
onde estava exposto sobre o altar à veneração dos fiéis o painel do Santo
Condestável, e não se interrompeu a tradição litúrgica na Ordem Carmelita e em
várias Igrejas.
Processo
de Canonização
Com uma
vida tão rica de santidade reconhecida, depressa apareceram atos de intercessão
e até milagres e que vêm descritos na Crônica dos Carmelitas", já citada.
Várias tentativas se fizeram a seguir à sua morte para introduzir o Processo de
santidade, mas sem êxito. O próprio D. Duarte, após seis anos da sua morte, faz
diligências para que se abra em Roma o Processo. Os mais significativos foram
as súplicas dirigidas à Santa Sé para a Beatificação e Canonização, conforme as
leis e normas seguidas, pelos reis D. João IV e D. Pedro 11 e pelo Episcopado Português.
O
Processo ordinário de Lisboa toma mais corpo quando, com sentença dada a 07 de
Março de 19 1 4, foi apresentado à Sagrada Congregação dos Ritos, e mostra que
o culto que publicamente se lhe prestou logo depois da morte, cresceu com o
andar dos tempos, perseverando até hoje, com a autorização dos Ordinários.
Os
documentos da Cúria Patriarcal, da Biblioteca Nacional, dos Anais, Arquivos e
cronistas da Ordem Carmelita, narram e provam que o Servo de Deus tinha festa
anual nos primeiros dias de Novembro com Missa de Confessor; que diante do seu
túmulo ardiam lâmpadas; que lhe foram delicadas capelas e altares; que as sua
imagens e estátuas com sinais de Bem aventurado e coroadas de auréolas, eram
expostas à veneração particular e pública, e distribuídas pelos fiéis que as
pediam. Acrescem os reconhecimentos e transladações do seu corpo e relíquias,
feitas canonicamente em 1522, 1548, 1768, 1836 e 1906, em que se afirma ter
havido graças e prodígios operados por Deus por intervenção sua em favor dos fiéis
que imploravam a sua proteção.
Finalmente
em 14 de Fevereiro de 191 7 por pedidos instantes do Em.mo e Rev.mo Senhor
Cardeal D. Antônio Mendes Belo e do Episcopado Português, bem como do
Postulador Geral da Ordem do Carmo em Roma, a Sagrada Congregação dos Ritos
ultrapassou algumas formalidades e em 1 5 de Janeiro de 191 8 esta Congregação
propõe a Sua Santidade Sento XV que houve por bem confirmar e ratificar a
sentença de culto prestado desde tempos imemoriais ao Servo de Deus Nuno
Álvares Pereira, leigo, professo, da Ordem dos Carmelitas Calçados. Sendo
proclamado Beato Nuno de Santa Maria a 23 de Janeiro de 191 8.
A
partir daqui foi um trabalho constante para preparar a sua canonização com
várias iniciativas da Ordem Terceira do Carmo e a Cruzada Nuno Álvares e mais
tarde a Ala do Santo Condestável. Estamos em 1940, data em que o Papa Pio XII
pensou em canonizá-lo por equipolência (por Decreto), mas o Processo não foi
adiante. Em 28 de Maio de 1941 num documento que se chama "Restrito de
Reassunção da Causa" Sua Santidade Pio XI 1 autoriza começar o Processo da
Canonização "Via milagre". Muito se trabalhou até 1948 neste Processo
que parou abruptamente sem ainda se descobrir a sua causa. Em 1960, ao celebrar
se o 61 Centenário do seu nascimento, recomeçou se a campanha com as relíquias
percorrendo Portugal, mas antes do seu final rebentou a guerra no Ultramar
Português que aglutinou toda a atenção dos portugueses, ficando mais uma vez
para segundo plano o Processo de Canonização.
Em 13
de Abril de 2000 fui nomeado Vice Postulador para a Causa de Canonização do
Servo de Deus Nuno de Santa Maria Álvares Pereira pelo Postulador da Ordem
Carmelita, Pe. Frei Filipe Amenós i Bonet.
Comecei
por fazer uma recolha de assinaturas para pedir ao Santo Padre a Canonização
por Decreto como Pio XII o queria fazer. Houve uma recepção e colaboração,
recolhendo-se muitos milhares de assinaturas. Enviadas estas para a Causa dos
Santos foi-nos respondido que não poderia ser por este meio, mas como Pio XII
tinha indicado "via milagre". Começando os preparativos tivemos a
alegria de no dia 13 de Julho de 2003 em sessão solene nas Ruínas do Carmo, o
Em.mo e Rev.mo Senhor Cardeal Patriarca de Lisboa, D. José da Cruz Policarpo,
reabria o Processo da "fama e santidade" do Beato Nuno de Santa
Maria, nomeando um tribunal e a Comissão Histórica para o efeito. O Trabalho
decorreu a bom ritmo de modo que em 03 de Abril de 2004 o mesmo Senhor Cardeal
encerrava o Processo em Sessão Solene na Igreja do Santo Condestável em Lisboa.
No dia
23 de Novembro de 2004 o Em.mo e Rev.mo Senhor Cardeal Patriarca de Lisboa,
nomeava por sua vez o tribunal que estudaria o Processo do suposto milagre
ocorrido na pessoa da Dona Guilhermina de Jesus. No dia 29 de Setembro de 2000
estando ela a fritar peixe salpicou óleo fervente atingindo a córnea do olho
esquerdo. Não obedecendo aos tratamentos, ele e um grupo de pessoas fizeram a
Novena ao Beato Nuno pedindo a cura.
Esta
cura operou-se na noite de 07 de Dezembro instantaneamente.
Este
Processo encerrou-se no dia 10 de Janeiro de 2005 e enviado para a Causa dos
Santos em Roma.
Em 17
de Outubro de 2006 recebemos da Causa dos Santos pela informação do Padre
Emanuel Boaga uma nota a pedir-nos que a Comissão Histórica preparasse mais um
estudo complementar, pois o primeiro trabalho desta só contemplava o período
pós a Beatificação e não o anterior. Como o Processo da Beatificação foi só
para provar que tinha havido culto ininterrupto desde a sua morte, não
contemplou as obras escritas. Assim deste modo no dia 11 de Janeiro de 2007
torna posse um novo tribunal e a Comissão Histórica com a finalidade de
apresentar o estudo suplementar ao primeiro processo.
Dedicou-se
esta Comissão ao árduo trabalho de investigação centrada no Arquivo Nacional da
Torre do Tombo, na Biblioteca Nacional de Lisboa, na Biblioteca Carmelita, na
Biblioteca da Academia das Ciências e outras. Todo este estudo estava concluído
em poucos meses.
Depois
de tudo entregue e aceite na Congregação para a Causa dos santos e dos
convenientes estudos, o Santo Padre Bento XVI aprova os decretos sobre as
virtudes heróicas do beato Nuno de Santa Maria e o Decreto sobre o milagre no
dia 03 de Julho de 2008 e em 21 de Fevereiro marca o dia 26 de Abril de 2009
para a cerimônia da Canonização. Com esta cerimônia dá-se por concluído este
processo que conheceu vários tempos e várias vicissitudes.
A minha
sensação neste momento é de regozijo por estar envolvido neste trabalho que com
a graça de Deus e a proteção maternal de Maria Santíssima chegou a um bom
êxito.
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