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sexta-feira, 18 de outubro de 2013

29º Domingo do Tempo Comum: A viúva que enfrenta o juiz: Impaciência e persistência como modelo de fé e oração (Lucas 18,1-8)

Odja Barros.
A parábola da viúva persistente de Lucas 18,1-8 é material exclusivo do Evangelho de Lucas. Não se encontra nos outros Evangelhos e tem por tema principal a persistência na oração aqui entendida e vinculada à ação. A mulher viúva é tomada como exemplo da oração que agrada a Deus. Sua ação incansável e obstinada em busca da justiça e do direito é o exemplo maior de fé e oração esperada por Deus. Essa parábola na maioria das vezes é superficialmente interpretada limitando a força da parábola apenas à persistência na oração. Ignora-se que, para além da persistência na oração, a parábola traz uma mensagem forte de luta incessante, persistente e impaciente pela justiça. Luta que uma pobre viúva enfrenta diante de um insensível juiz. Ela o enfrenta com uma atitude obstinada e até agressiva em busca de justiça.
O que nos conta a Parábola?
A parábola apresenta certa cidade onde havia um juiz que não temia a Deus e nem se importava com as pessoas. Na mesma cidade, havia também uma viúva que se dirigia continuamente a ele dizendo: "Faze-me justiça contra meu adversário!" (18,2-3).  O juiz está bem descrito: Ele é um juiz que não teme a Deus e nem se importa com as pessoas. E sobre a viúva? O que é dito? Não é apresentada qualquer informação sobre ela, não se sabe sequer qual era a causa que aflige o direito dessa mulher. Sabe-se apenas que ela está sendo prejudicada nos seus direitos por causa de alguém denominado de "adversário" e que por isso procura o juiz a quem se dirige de forma contínua e persistente travando uma luta obstinada e incansável pela justiça.
 "Faça-me justiça contra meu adversário"
Essas são as únicas palavras da viúva na parábola. Nestas palavras está inscrita a história dessa viúva e a história de tantas outras mulheres e grupos oprimidos em busca e em espera pela justiça em sua época.
Desprovido de temor a Deus e interesse pelas pessoas, o juiz não parece se importar pela situação daquela mulher. A pobre viúva sem dinheiro ou poder tem a seu favor apenas o recurso da intimidação e da persistência. A ação da viúva é expressa como uma ação contínua e ameaçadora que atinge o juiz onde ele poderia ser atingido: na preocupação egoísta do seu próprio conforto.
Aborrecer e importunar até que me faça justiça
Essa foi a estratégia de luta dessa mulher. Ela vinha todos os dias diante do juiz e o importunava e o aborrecia. O termo grego que aparece em 18,5 é "hypopiadzein" significa uma bofetada em baixo dos olhos que deixa uma marca roxa característica que denuncia em público a agressão sofrida. O uso do termo na parábola não quer dizer que isso tenha acontecido, mas que o juiz temia que isso pudesse acontecer o que lhe causaria muito constrangimento público. Por isso, ele é coagido pela ação ativa e insistente e ameaçadora da viúva a agir em favor dela.  Naquela mulher obstinada, o insensível magistrado encontrou adversário à sua altura. Ele podia ter sido assaltado por persistência obstinada antes, mas nenhuma que se igualasse aos apelos infindáveis e insistentes desta mulher. Ele lhe fez justiça, não porque fosse justo ou mesmo compassivo, mas porque percebeu que não conheceria um momento de paz até que atendesse aquela mulher.
A vida das mulheres viúvas e o sistema injusto
As viúvas e os órfãos sempre eram no mundo antigo, do ponto de vista estrutural, as primeiras vítimas das injustiças e alvos de descaso e de tentativas de fraude e exploração. Desde o Antigo Testamento Deus aparece intervindo em defesa dos grupos que sofrem essa injustiça estrutural. A viúva da parábola de Lucas 18,1-8 chama a nossa atenção pela sua persistência na luta pelos seus direitos. Ela se fundamenta no direito divino. A atitude dessa mulher é do começo ao fim destacada como referência de quem se deve aprender. Diante da violência do sistema injusto é preciso resistir com firmeza e intrepidez.
Segundo Ivoni Richter, a situação de vida e o atuar desta viúva não é um caso isolado na antiguidade. Com seu exemplo, a parábola condensa a experiência de muitas viúvas, as quais, conforme a tradição veterotestamentária, tantas vezes está exposta à injustiça, à não realização dos seus direitos. A parábola de Jesus assume positivamente a experiência desta viúva que luta por seus direitos. E os conquista. Com isto, a parábola quer estimular e animar as pessoas crentes à oração ativa e continua em meio ao sofrimento da vida. Portanto, a parábola reflete a situação de vida das viúvas que muitas vezes tiveram que levantar-se e impor-se para garantir seus direitos.
A esperança escatológica e a justiça de Deus
Os versos 6 a 8 inserem a parábola no contexto da esperança escatológica e aligam com o tema da vinda do filho do homem de Lucas 17,20-37. Neste sentido, justiça, juízo, graça e perseverança são temas que se unem na parábola. O estabelecer da justiça de Deus está vinculado à vinda do filho do homem que virá para fazer justiça aos pobres e oprimidos que se confrontam com situações cotidianas de direitos negados. Mas, a justiça de Deus é motivada pelo seu amor e sua misericórdia e não pela preocupação consigo mesmo como no caso do juiz injusto da parábola. É nesse contexto que Lucas insere a parábola da viúva persistente, advertindo para não desanimarmos na luta ativa para fazer presente a justiça de Deus.  
A impaciência e persistência da mulher como modelo de fé e oração
A parábola encerra com a pergunta problematizante: "Quando o filho do homem vier, encontrará fé na terra"? O exemplo da viúva persistente fica claramente apresentado como modelo a ser seguido pela comunidade de discípulos e discípulas. A advertência de Jesus é quanto à espera ativa e persistente pelo reinado de Deus. A fé aqui referida é sinônimo da postura e ação da viúva em que, na situação de injustiça na qual parecia haver total ausência de Deus, ela se implica de maneira insistente e incansável.  Portanto, manter a fé significa não desanimar, não desistir e perseverar em busca incessante da realização da ação salvadora e libertadora de Deus, comprometendo-se com seu projeto de justiça, principalmente para os grupos mais excluídos e oprimidos para quem Ele,  justo juiz,  dirige sua misericórdia.
O exemplo trazido nessa parábola nos convida a viver uma fé não fatalista e não conformista, mas uma fé e oração ativa, combativa e persistente comprometida e implicada com a luta pelos direitos das pessoas mais excluídas. A pergunta continua pertinente: Será que quando o filho do homem vier, encontrará fé como a dessa mulher? Que a herança e exemplo dessa parábola nos ajudem a manter uma fé ativa e operante em meio ao mundo de estruturas injustas.

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